Falando de Economia com Beto Bellini - As lendas da internet e outras coincidências

22/04/2024

O advento da internet nos apresenta diariamente uma série de lendas e correntes que, inadivertidamente, passamos adiante. Ou é a bebezinha que precisa de 1 centavo do UOL para cada e-mail reenviado ou o banco que você nunca teve conta corrente que informa que seu cadastro foi bloqueado ou ainda aquela benção especial que sua família receberá desde que você reenvie a mensagem para 26 amigos em menos de 5 minutos. 

Uma das mais recentes atribui algumas declarações sobre a Europa a um “venerável professor de Economia chinês Kuing Yamang, que viveu durante muitos anos em França”.

O texto é composto por citações de uma entrevista que o professor teria dado à televisão. Yamang faz algumas corrosivas considerações sobre o modelo social e econômico europeu em “autodestruição”.

Depois de denunciar algumas verdades já reconhecidas por muitos europeus (e que poderia ser no Brasil ou em Sertãozinho!), como se tivesse acabado de descobrir a pólvora, o professor avisa que, dentro de algumas gerações, os chineses ultrapassarão a Europa.

Claro que tudo isto é falso. O texto que circula já em português resulta da transcrição das legendas (originalmente em francês) de uma entrevista numa televisão chinesa.

Acontece que os dois homens – o hipotético professor e um jornalista – não dizem o que está legendado: na verdade, falam da Exposição Universal de Shangai. E é a legendagem falsa que acaba por dar origem a esta corrente “para ler e refletir”.

Quem foi o autor? A própria pessoa que colocou o vídeo no YouTube. A sua intenção foi a de enganar a blogosfera política, pondo-a a discutir afirmações que ninguém proferiu. Também não existe nenhum professor Kuing Yamang – o autor da fraude criou este nome em referência a um bolo francês, o Kouign Amann.

O que dizia o texto, entre algumas partes:

1.A sociedade europeia está em vias de se autodestruir. O seu modelo social é muito exigente em meios financeiros. Mas, ao mesmo tempo, os europeus não querem trabalhar. Só três coisas lhes interessam: lazer/entretenimento, ecologia e futebol na TV! Vivem, portanto, bem acima dos seus meios,
porque é preciso pagar por estes sonhos de crianças...  

  1. Os seus industriais mudam suas empresas para outros países porque não estão dispostos a suportar o custo de trabalho na Europa, os seus impostos e taxas para financiar a sua assistência generalizada.
  2. Portanto endividam-se, vivem a crédito. Mas os seus filhos não poderão pagar esta dívida.
  3. Os europeus destruíram, assim, a sua qualidade de vida empobrecendo. Votam orçamentos sempre deficitários. Estão asfixiados pela dívida e não poderão honrá-la.
  4. Mas, para além de se endividar, têm outro vício: os seus governos “sangram” os contribuintes. É um verdadeiro “inferno fiscal” para aqueles que criam riqueza.
  5. Não compreenderam que não se produz riqueza dividindo e partilhando, mas sim trabalhando. Porque, quanto mais se reparte esta riqueza limitada, menos há para cada um. Aqueles que produzem e criam empregos são punidos por impostos e taxas e aqueles que não trabalham são encorajados por
    ajudas. É uma inversão de valores.
  6. Portanto, o seu sistema é perverso e vai implodir por esgotamento e sufocação. 
  7. Existe um outro problema: existem funcionários públicos demais, um emprego em cada cinco. Estes funcionários são sedentos de dinheiro público, são de uma grande ineficácia, querem trabalhar o menos possível e, apesar das inúmeras vantagens e direitos sociais, estão muitas vezes em greve. 

Muitos itens são coincidentes com a situação brasileira, por serem genéricos. Se mudássemos o nome e a nacionalidade do professor, alguns leitores acreditariam facilmente.

Vivemos isso intensamente nas eleições presidenciais e nos últimos meses. Viveremos isso nessas eleições municipais. E repassaremos muitas bobagens se não verificarmos as fontes, ou pelo menos a veracidade em sites como boatos.org.

Portanto, um pouquinho de atenção e critério na leitura podem evitar a disseminação de mensagens falsas e uma imagem negativa de quem está repassando.

 

Prof. Gilberto César Ortolan Bellini, mestre em administração, professor de Gestão Empresarial (administração) da Fatec Sertãozinho e Unip Ribeirão Preto, e membro da Academia Sertanezina de Letras ASEL.