A Reforma Tributária – Principais pontos

A Reforma Tributária – Principais pontos
11/07/2023

DR MARCELO ADV

 

A Reforma Tributária – Principais pontos

 

Na noite desta quinta-feira (06), a versão final do texto relatório da Reforma Tributária foi aprovada, em maioria esmagadora em plenário da Câmara em dois turnos. Mais do que bem-vinda neste caos tributário que reside o país, a reforma sofreu absurda pressão de vários grupos de interesses. No fim, o texto atendeu em parte os pleitos estaduais, incluiu demandas de setores como agronegócio e ampliou a lista de setores que terão regime diferenciado.

Fundamental não perdermos de vista os princípios basilares que a nortearam: simplificação tributária, simplificação da segurança jurídica, transparência, maior equidade e fim de privilégios, manutenção da carga tributária global, combate à evasão e à sonegação, neutralidade nas decisões econômicas e aumento do PIB potencial em cerca de 0,5% ao ano. Pode-se observar que alguns dos princípios norteadores acima descritos são de caráter duvidoso. Pouco crível. Acredito que o mais importante da reforma seja a esperada simplificação dos tributos numa alíquota padrão estimada em 25% (a ver).

A Reforma Tributária cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituirá o ICMS estadual e o ISS municipal, e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que ficará no lugar de tributos federais, como o PIS e a COFINS. A proposta também cria um Imposto Seletivo que compensará o fim do IPI e servirá para desestimular o uso de produtos que fazem mal à saúde e ao meio ambiente. Um outro princípio altamente relevante e bem-vindo é o de deslocar a cobrança do imposto (ICMS) da origem (onde a mercadoria é produzida) para o destino (onde é consumida). Esta mudança tem dois efeitos fundamentais: acabar com a guerra fiscal dos 27 Estados e impedir a cumulatividade dos impostos pagos em cadeira.

Como relação aos Estados e Municípios, o relatório traz uma definição sobre as configurações e atribuições do Conselho Federativo, como demandado pelos governadores. Em relação à composição, os Estados e o Distrito Federal terão 27 membros, um para cada ente federado. Os municípios e o Distrito Federal também serão representados por 27 membros, sendo 14 eleitos com base nos votos igualitários e 13 com base nos votos ponderados pelas respectivas populações. O texto define ainda que as deliberações do órgão serão aprovadas em duas etapas, uma por maioria absoluta e outra pelo tamanho da população. O relatório, no entanto, não trouxe critérios de divisão dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FDR), que receberá aportes do Governo Federal para Estados e municípios. Essa também era uma demanda dos Estados. Os critérios serão estabelecidos por lei complementar.

O texto aprovado abre ainda a possibilidade de os Estados instituírem um novo tributo: uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados, produzidos nos seus territórios, para investimento em obras de infraestrutura e habitação. Em atendimento ao pleito dos municípios, o relatório prorroga até 2032 a desvinculação de 30% das receitas municipais e amplia as possibilidades de aplicação de receita da COSIP, contribuição destinada exclusivamente ao custeio do serviço de iluminação pública. Em relação aos regimes favorecidos, o texto reduz a alíquota destes regimes em 60% da alíquota padrão. Na prática, haverá uma carga tributária correspondente a 40% da carga padrão, que ainda será definida, mas é estimada em 25%. Os regimes favorecidos incluídos no texto são: educação; saúde; dispositivos médicos e de acessibilidade para pessoas com deficiência; medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual; serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário, ferroviário e hidroviário, de caráter urbano, semiurbano, metropolitano, intermunicipal e interestadual; produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura; insumos agropecuários, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal; e produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais.

De última hora, por meio da emenda aglutinativa, também foram incluídos "produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura" e "atividades desportivas" nos bens ou serviços que terão redução da alíquota. Serviços beneficiados pelo Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) foram classificados em regime diferenciado. Também foi ampliada imunidade tributária para "entidades religiosas, templos de qualquer culto, incluindo suas organizações assistenciais e beneficentes". O relatório inclui a criação de um fundo, custeado e gerido pela União, para fomentar o "desenvolvimento e a diversificação das atividades econômicas no Estado".

A legislação também deverá prever a utilização dos recursos para compensar eventual perda de receita do Estado decorrente das mudanças no sistema de cobrança de impostos sobre consumo. O relator deixou ainda um espaço para a União fazer mais aportes ao fundo. Esse aporte adicional será condicionado à redução de benefícios para Zona Franca de Manaus desde que com anuência do Estado do Amazonas. O parecer manteve as vantagens do polo industrial pelo menos até 2073, como já previsto na Constituição. O texto da PEC também inclui um comando para ampliar a incidência do Imposto Seletivo (IS) nos bens e serviços da Zona Franca de Manaus como forma de garantir a preservação ambiental. O imposto seletivo será criado para coibir o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, a serem definidos por lei.

Para a cesta básica, o relator Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) decidiu zerar a alíquota de imposto. Na versão anterior do relatório da reforma, a cesta básica era onerada em 50% da alíquota padrão do imposto único sobre consumo, que será definida posteriormente por lei complementar. Quanto ao agronegócio, motor do país, o relatório elevou a linha de corte de receita de R$ 2 milhões para R$ 3,6 milhões por ano, para que produtores rurais possam ficar de fora da nova tributação e se mantenham em um regime diferenciado de recolhimento de impostos por meio de crédito presumido. A modalidade é conhecida como "Simples Rural" e atende uma das demandas da Frente Parlamentar do Agronegócio (FPA). Pelo texto, o produtor rural pessoa física ou jurídica que obtiver receita anual inferior a R$ 3,6 milhões, atualizada anualmente pelo IPCA, poderá se beneficiar da medida.

O relator especificou no novo parecer que a cobrança de IPVA sobre veículos automotores terrestres, aquáticos e aéreos não incidirá sobre aeronaves agrícolas, tratores e máquinas agrícolas - estes últimos atendem ao setor do agronegócio. Para as cooperativas, o parecer também cria um regime específico "com vistas a assegurar sua competitividade, observados os princípios da livre concorrência e da isonomia tributária". Uma lei complementar deverá definir as hipóteses em que o imposto não incidirá sobre as operações realizadas entre a sociedade cooperativa e seus cooperados e os créditos do imposto que serão transferidos.

Por fim, o texto fala muito em “neutralidade tributária. O novo parecer inclui uma trava de segurança para evitar o aumento da carga tributária com as modificações no sistema de impostos no país. No parágrafo terceiro do artigo 129, em que se dizia que "as alíquotas de referência serão revisadas anualmente", foi acrescentada a expressão "visando à manutenção da carga tributária". Já a forma de revisão dessas alíquotas, de modo a garantir a neutralidade, será definida em lei complementar. O texto determina que o Ministério da Fazenda será responsável por elaborar proposta para o cálculo das alíquotas dos novos impostos. A pasta "deverá fornecer todos os subsídios necessários, mediante o compartilhamento de dados e informações, inclusive as protegidas por sigilo fiscal, cujo formato e conteúdo deverão ser regulamentados pelo Tribunal de Contas da União", diz o texto. A sociedade deve estar vigilante para que não haja aumento da carga tributária, que hoje já atinge absurdos 34% do PIB. Vamos aguardar.

Marcelo Fortes Giovannetti, graduado e pós-graduado em Direito pela PUC/SP, com especialização em Direito Empresarial do Trabalho, Direito Concorrencial e Regulatório FGV. contato: marcelo.fortes@mfglaw.com.br.