Aos trancos e barrancos
Continuando a nossa conversa sobre os golpes de estado e a conquista do poder no Brasil por todos os matizes ideológicos, iniciamos com algumas frases feitas, mas que dão conta da complexidade que é tentar entender o Brasil. Frases como “aos trancos e
Barrancos” mostram que o Brasil caminha a torto e à direita, mas, no nosso entender, a frase mais próxima de um resumo histórico é: “façamos a revolução antes que o povo a faça”.
Surgida, nos parece, no início dos anos 1930 (de autoria desconhecida, mas atribuída nos livros escolares, a Antônio Carlos de Andrada, o governador traído das Minas Gerais), a referida frase mostra que a elite brasileira é extremamente competente em manter o poder e afastar da direção do Estado os seus verdadeiros inimigos (não confundir com adversários, pois estes são tolerados).
Neste bojo, um dos mais belos golpes dados ocorreu logo após a Proclamação da Independência, quando a elite aristocrática – leia-se grandes latifundiários – pretendia governar o país por meio do legislativo (liberalismo), retirando o poder das mãos dos conservadores, “grandes comerciantes aliados de Dom Pedro I e que, portanto, queriam o executivo forte”.
Como se vê, a luta entre liberais e conservadores é muito antiga no Brasil. Ato contínuo os liberais queriam controlar a Assembleia Constituinte, impedindo os pobres e os ricos comerciantes de se tornarem legisladores. Para evitar os pobres, a votação tornou-se censitária, ou seja, era preciso provar uma renda anual para ser candidato a deputado ou a senador. Desta maneira, os pobres ficaram fora da votação, mas a fineza do golpe foi evitar os comerciantes que eram ricos. Para isso, a riqueza não foi medida em dinheiro, mas em quantidades de farinha de mandioca que só os fazendeiros tinham e, portanto, os comerciantes não puderam participar da Assembleia.
Os latifundiários dominaram a Assembléia e elaboraram o projeto chamado jocosamente de Constituição da Mandioca, projeto esse que desagradou a Dom Pedro I, que preferiu encerrar as atividades dos constituintes e, num ato de força, outorgou a Constituição de 1824. Descontentes, os fazendeiros praticamente expulsaram Dom Pedro I do Brasil. Fazendo um hiato para voltarmos ao Estado Novo de Getúlio Vargas, que acabou inventando o populismo à moda do Brasil. Destarte, ele evitou a Revolução Comunista de Prestes. E é bom lembrar que Getúlio, por meio dos seus informantes, soube antecipadamente da tentativa de golpe e deixou acontecer para prender seus inimigos e fortalecer a sua própria ditadura em nome da liberdade. “Mas a política entrou pelos contrários”. Quem presta atenção na política brasileira, sabe que o mandatário de hoje é o deposto de amanhã. A administração Varguista aproximou-se demais dos “pobres”, como, por exemplo, a criação da CLT, que até hoje os liberais tentam colocar fim. Graças ao contexto da II Guerra Mundial, conflito que o exército brasileiro lutou favoravelmente à democracia enquanto o Brasil vivia uma ditadura. Essa contradição serviu de pretexto para a deposição de Vargas (1945).
O próximo presidente, o famoso general Gaspar Dutra, fez um governo liberal que foi um fiasco e, por isso, Getúlio saiu do Rio Grande do Sul, onde estava exilado” para, “nos braços do povo”, voltar ao palácio presidencial do Catete. O segundo governo de Getúlio (1950-1954) foi uma grandiosa confusão. Socialistas e ultraconservadores brigaram o tempo todo. Naquela altura, o maior inimigo de Getúlio era o famigerado Carlos Lacerda, governador da Guanabara (estado que foi incorporado pelo Rio de Janeiro), dono do jornal A Tribuna da Imprensa, que tinha mais poder que a Rede Globo tem hoje, pois Lacerda tinha o apelido de “o demolidor de presidentes”, Ele derrubou Getúlio Vargas, que se matou, Jânio Quadros, que renunciou e João Goulart, que foi deposto. Nesta conjuntura, Lacerda juntou-se à UDN (União Democrática Nacional) para pedir a tomada de poder pelos militares, o que ocorreu em 1964.
Prof. Egydio Neves Neto
Prof. Renata Neres