Artigo: Obrigação de criança: brincar e ser feliz! (por Tatiane Cristina Pereira Guidoni Gimenez)
Esses dias, perguntei para minha filha qual tema ela me sugeriria para escrever um artigo. Até tenho muitos assuntos que gostaria de compartilhar com meus leitores, porém, mesmo com tantos conteúdos borbulhando em minha memória, gosto de receber sugestões. E assim, seguindo a indicação do meu anjo, lá vou eu.
Além de sugerir, ela explicou o porquê de tal sugestão. “Acho que você poderia escrever que a criança não tem que trabalhar e que a única obrigação dela deveria ser estudar, brincar e ser feliz”, completou minha pequena grande menina, de 11 anos de idade.
Orgulhosa e feliz por ter trazido ao mundo uma criança sensível e que me ensina diariamente, respondi que escreveria sobre o tema proposto. E cá estou para compartilhar um pouco desse assunto.
Antes, porém, tenho que mencionar que eu, com 11 anos de idade, faltando pouco mais de um mês para entrar na casa dos 12, comecei a trabalhar aos finais de semana como empacotadora num supermercado da cidade. Naquela época, em 1992, era comum que adolescentes fizessem esse tipo de serviço aos sábados e recebessem pelo dia trabalhado.
Eu era uma criança entrando na fase pré-adolescente e que, cheia de sonhos e vontade de ser independente, quis ganhar meu próprio dinheiro para comprar o que gostaria, sem ter que pedir para minha mãe ou minha avó materna.
Cheia de coragem, num sábado de manhã, lá fomos eu e uma colega nos oferecer para ser “pacote” – nome dado à função –, no antigo Supermercado Gimenes. Tinham vários adolescentes aguardando para serem “pegos” para o referido posto, e nós, novas no pedaço, ficamos apreensivas por acharmos que não nos pegariam. Para nossa alegria, era fim de ano e precisavam de muitos empacotadores para atender à demanda; assim fomos contratadas para trabalhar naquele dia.
Outros sábados chegaram e lá estávamos nós, que passamos a ser contratadas semanalmente para o trabalho. Era cansativo, porém, ficávamos felizes por estar naquele local, trabalhando, aprendendo e ganhando nosso dinheirinho.
Por quase três anos, segui a rotina de trabalhar aos sábados, e em algumas ocasiões, me oferecia para trabalhar durante a semana, no período da tarde, após sair da escola. Eu amava o que fazia e até cheguei a sonhar em me tornar caixa do supermercado quando fizesse 16 anos e pudesse ter registro em carteira. O sonho não aconteceu – assunto que pode ser abordado em outra ocasião –.
Por que estou falando isso tudo? Porque mesmo trabalhando aos sábados, e eventualmente no período vespertino ao longo da semana, eu tinha tempo para estudar, brincar e ser feliz.
Hoje, infelizmente, vemos muitas crianças que estão trabalhando, não somente porque querem ter seu próprio dinheirinho para comprar itens que desejam, como um lanche ou uma roupa, por exemplo, mas porque veem e sentem as dificuldades da família para suprir o lar com o básico ou porque alguns adultos as obrigam a trabalhar, imputando a elas responsabilidades que não são de seres humanos tão pequeninos.
Tristemente, vemos em muitos semáforos e portas de estabelecimentos comerciais, crianças de 6, 7 anos de idade, sob sol ou chuva, com pacotes de doces e/ou balas, vendendo tais itens, para auxiliar no sustento da família, sendo expostas a diversas circunstâncias perigosas e deixando de estudar, aprender e brincar.
Em minha opinião, trata-se de uma gravidade imensurável que precisa ser combatida, porque, infelizmente, é uma forma de exploração da criança, que fica por longas horas tentando vender produtos, inclusive no período noturno, deixando de viver plenamente a parte mais curta da vida, que é a infância, que segue até os 12 anos de idade.
Claro que não podemos ser hipócritas e deixar de lado os problemas sociais existentes dentro de várias famílias, que são muitos, e que impulsionam essas cenas diariamente em todo o país.
Todavia, não se pode fechar os olhos para essas situações, comprar uma bala, chocolate ou qualquer outro item para ajudar a criança e achar que fez a sua (nossa) parte.
Temos que exigir que as políticas públicas existentes sejam colocadas em prática de fato, suprindo as necessidades básicas das famílias que precisam de apoio dos governos, auxiliando-as e também orientando-as quanto ao que pode ser feito para que tenham uma qualidade de vida melhor, sem que haja exposição de suas crianças, proporcionando-lhes o que precisam para cada fase da vida.
Além disso, acredito que os órgãos, como os Conselhos Tutelares, por exemplo, devam ficar mais atentos às variadas situações de exposição de crianças, fiscalizando e agindo para evitar cenas que têm se tornado tão comuns, de seres humanos pequeninos vendendo e/ou pedindo em muitas esquinas por aí. Porque isso, definitivamente, não é trabalho!
Obrigação de criança é brincar, estudar – se estiver na idade – e ser feliz!
Por: Tatiane Cristina Pereira Guidoni Gimenez
Jornalista – MTB: 47.966
Instagram: @tatianeguidonigimenez