Dra. Rita entrevista a psicóloga Ana Paula, sobre o abuso infantil
Ana Paula Mucha Tonetto - CRP 06/98946
O que é violência sexual infantil? Quem é afetado?
É o ato praticado pela pessoa que usa uma criança ou um adolescente para satisfazer seu desejo sexual. Todo envolvimento de uma criança em uma atividade sexual na qual não compreende completamente, já que não está preparada em termos de seu desenvolvimento. Não entendendo a situação, a criança se torna incapaz de informar seu consentimento. O abuso sexual infantil é evidenciado pela atividade entre uma criança com um adulto ou entre uma criança com outra criança ou adolescente que, pela idade ou nível de desenvolvimento, está em uma relação de responsabilidade, confiança ou poder com a criança abusada. É qualquer ato que pretende gratificar ou satisfazer as necessidades sexuais de outra pessoa, incluindo indução ou coerção de uma criança para se engajar em qualquer atividade sexual ilegal. Pode incluir também práticas com caráter de exploração, como uso de crianças em prostituição, o uso de crianças em atividades e materiais pornográficos, assim como quaisquer outras práticas sexuais.
Como uma criança pode dar sinais de que está sendo abusada? Quais são as características de quem sofre a violência?
É preciso estar atento e sempre disponível para ouvir as crianças. Na maior parte das vezes, a criança ou o adolescente demonstra algum comportamento que indica que algo errado está acontecendo. Os sinais podem ser psicológicos e/ou físicos.
A exemplo:
- Atitudes sexuais que não condizem com a idade;
- Demonstração de conhecimento sobre atividades sexuais superiores à sua idade;
- Masturbação frequente;
- Brincadeiras que possibilitem o acesso a intimidades;
- Mudanças abruptas de comportamento;
- Queda no rendimento escolar;
- Agitações no sono;
- Lesões na área genital;
- Infecções urinárias em repetição;
- Sangramento vaginal ou anal;
- Doenças sexualmente transmissíveis;
- Tristeza frequente;
- Baixa autoestima;
- Irritabilidade;
- Choro frequente;
- Tendência ao isolamento;
- Ansiedade e medo;
- Automutilação;
- Distúrbios alimentares;
- Nos casos mais graves, gravidez, aborto, tentativa de suicídio.
Como abordar sobre abuso sexual com as crianças? Como protegê-las?
Abordar formas de se proteger são atitudes que precisam ser ensinadas e conversadas com as crianças desde muito pequenas, tanto para meninas quanto para meninos. Explicar que somente algumas pessoas de confiança podem ajudar no banho, podem tocá-la e de que forma, e que, caso aconteça algo estranho, diferente, a criança pode contar aos pais e/ou responsáveis.
Hoje, encontramos um material vasto que nos ajuda a abordar o tema, disponível gratuitamente na internet, como livros e canais no YouTube, além de materiais de diversas campanhas realizadas sobre o tema. Basta fazer uma busca simples com as palavras violência sexual criança, como conversar. Uma orientação importante oferecida aos pais é assistir primeiro ao vídeo ou ler o livro antes de mostrá-lo às crianças, para avaliar se está de acordo com os valores da família, se concorda. Não é porque está na internet que é bom e confiável.
A criação de um ambiente de trocas e diálogo, a partir de uma relação de acolhimento e não julgamento. Muitos pais e cuidadores desacreditam no que as crianças dizem, acabando por afastá-las. Quando perceber que a criança tem medo de alguém ou de alguma situação, procure conversar sobre isso, ouvir bastante e, se tiver dúvidas, não permita o contato, não deixe a criança vulnerável, convivendo em um ambiente impróprio ou que desperta desconfiança.
Conversar sobre as diversas situações de abuso que existem, levando em consideração a idade da criança, utilizando uma linguagem acessível a ela e que não a choque, auxiliar crianças e adolescentes a identificarem as situações de violência, perceberem riscos, terem consciência dos limites em relação ao corpo e formas de cuidado, e terem acesso a informações sobre como pedir ajuda. Conhecer os tipos de violência contribui para não aceitar sofrer uma, não ficar calado, tomar uma atitude.
Porque as crianças omitem o abuso?
Infelizmente, dados publicados pela Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos indicam que, no Brasil, a maioria dos casos de estupro acontece dentro de casa, por pessoas próximas, de convivência da criança ou do adolescente. Muitas vezes, o segredo se instala por medo. A criança passa a se sentir culpada, acredita no que o abusador diz, sofre chantagem, ameaças, ganha presentes ou acredita que vai obter algo em troca (brinquedos, doces, etc). Por inocência, é induzida a não contar, a instalar um segredo. Não podemos esquecer que, por ser alguém próximo, existe o receio de quebrar, prejudicar a relação familiar. Por isso, evitar o sofrimento da mãe, da família, ainda que as custas de dores profundas sofridas no corpo e na alma.
A Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos registrou um total de 7.447 denúncias de estupro no Brasil nos cinco primeiros meses de 2022.
Das vítimas, 5.881 são crianças ou adolescentes — quase 79% das denúncias. Com menos de 11 anos, representam 36%. Os números chamam atenção para a necessidade urgente de proteger as crianças e os adolescentes.
Uma criança tem noção do que seria um abuso?
A criança não está preparada em termos de seu desenvolvimento para compreender o que é uma atividade sexual. Não entendendo a situação, ela se torna incapaz de informar seu consentimento. Dessa forma, uma criança não tem noção do que seria um abuso. O conhecimento do próprio corpo é importante na prevenção e identificação de abusos sexuais. As crianças precisam ser ensinadas desde cedo sobre o tema e sobre a importância de não serem intimamente tocadas. Por isso, é tão necessário que as escolas tenham palestras e aulas sobre o assunto, e os pais transmitam informações aos filhos. O autoconhecimento é essencial em todas as faixas etárias. Quando levamos informação, a denúncia se torna possível. A mídia faz um importante papel de levar informações e conhecimento dos casos para o público.
Quais as consequências do abuso sexual?
Inúmeras são as consequências. Quando o abusador não é punido e não acontece nada para reparar o mal, as consequências podem ser piores. Já quando existe justiça, alguma forma de reparação, a vítima tem mais possibilidades de ressignificar todo o trauma e medo vividos.
Seguem exemplos:
- Distúrbio ou impossibilidade de assumir uma vida adulta saudável;
- Dificuldades no desenvolvimento afetivo e sexual;
- Transtornos psicossomáticos, dores sem explicação;
- Transtorno do estresse pós-traumático;
- Depressão;
- Suicídio;
- Promiscuidade sexual;
- Prejuízo no desempenho escolar e acadêmico;
- Apatia;
- Uso e abuso de substâncias;
- Transtornos de personalidade;
- Dificuldade para se sentir amado e confiar nas pessoas.
O que fazer se eu desconfiar? Como conseguir ajuda? Quais os meios públicos para conseguir ajuda?
Quando desconfiar, é necessário agir o quanto antes, procurar encontrar elementos que fundamentem a desconfiança e entrar em contato com os órgãos competentes que oferecem ajuda. Conversar com a criança, estabelecer um vínculo de confiança com ela, oferecer ajuda, conversar na escola e demonstrar a preocupação, tentar de alguma forma alertar a mãe, os pais e/ou responsáveis. A denúncia é feita de forma anônima e os profissionais iniciarão uma investigação também.
De forma anônima e gratuita:
Disque 100 – Vítimas ou testemunhas de violações de direitos de crianças e adolescentes, como violência física ou sexual. Disque 180 – Em casos de violência contra mulheres e meninas, seja psicológica, física, sexual causada por pais, irmãos, filhos ou qualquer pessoa.
Conselho Tutelar - (16) 3945-2711
CREAS – O Centro de Referência Especializada em Assistência Social é responsável por atender crianças, adolescentes e famílias em situação de risco, seja por violência, trabalho infantil, cumprimento de medidas socioeducativas ou violações de direito.
(16) 3945-6493.
Polícias – Quando estiver presenciando algum ato de violência, acione a Polícia Militar por meio do número 190.
Ana Paula Mucha Tonetto
Doutoranda e Mestre em Psicologia pela FFCLRP-USP. Especialista em Psicologia Clínica pela Unicamp.
Autora do livro “TDAH, criança e família: contribuições psicanalíticas”.
Atende em consultório: Psicoterapia com crianças, adolescentes e adultos. Orientação Vocacional. Avaliação Psicológica.
Telefone: 16 98204 5402
Endereço: Av. Luiz Eduardo Toledo Prado, 890. Shopping Iguatemi. Torre Empresarial. Sala 1013. Ribeirão Preto -SP.