Em tempo

13/03/2023

Após algumas colunas, examinando alguns golpes e contragolpes que ocorreram na linha História do Brasil, esperamos contribuir para um exame desses acontecimentos, pois um povo geralmente é um grupo de pessoas que tem uma história passada conjunta, uma história presente conjunta e quer ter uma história futura também conjunta.

A conquista do Estado pelos militares em 64, como já vimos, foi preparada ao longo de quase dez anos. Sem isso, não é possível tomar o poder. Os militares daquela época se dividiam em vários grupos. Ficaremos aqui com os mais importantes: os que queriam tomar o poder, e esses mesmos se dividiam em A Linha Dura (queriam o golpe a força física), os da Sorbonne (que eram favoráveis ao uso da inteligência militar), os comunistas (sim, tínhamos militares comunistas) e os Legalistas (que eram contrários à tomada do poder pelos militares). Assim, era necessário unir a tropa. Para isso, foi necessário o uso de uma estratégia, que vamos relatar a seguir: uma greve de sargentos da Marinha do Rio de Janeiro foi usada para mostrar que houve quebra da hierarquia, pois os comandantes mandaram encerrar a greve e os marinheiros a continuaram. Como sabemos, o Exército não pode suportar a quebra da hierarquia. Portanto, o medo do desmantelamento do Exército levou os militares a aceitarem a conquista do poder.

Decorridos muitos anos dos governos militares, começaram as pressões pelo fim do que era chamado, na época, de “Regime de Exceção”. De todas as pressões, citaremos apenas aquelas que são importantes para o nosso enredo: a pressão mais importante veio dos EUA, que propunham a desmilitarização do Estado, que ficou conhecida como a política de entrega do poder “lenta, gradual e segura”.

Os próprios empresários achavam necessária a entrega do Estado, pois as ameaças dos anos 50 e 60 não existiam mais. Além disso a Nicarágua saiu dos governos militares por meio de uma revolução sandinista (de esquerda). O medo de que isso viesse a ocorrer também no Brasil fez a “Sorbonne” concordar com a devolução do poder. Dentro do congresso, foram eleitos Tancredo Neves e José Sarney para governar o Brasil. Tancredo morreu sem tomar posse e José Sarney estava impedido pela Constituição, que previa que o vice só poderia assumir a Presidência se o presidente tivesse governado por 2 anos. Um novo jeitinho brasileiro, ou seja, um advogado, o Sobral Pinto, disse que havia uma jurisprudência: quando Rodrigues Alves morreu antes de tomar posse, seu vice assumiu a presidência.

Trata-se de uma meia verdade. O vice assumiu apenas para chamar novas eleições. José Sarney ganhou o mandato de Tancredo Neves inconstitucionalmente. O primeiro presidente eleito pelo povo no processo de redemocratização foi Fernando Collor. No entanto, depois de dois anos de governo e alguns fracassos econômicos, Collor desagradou a elite brasileira, que vai usar um novo expediente, a Constituição de 88, que permitia uma Comissão Parlamentar de Inquérito, CPI (a partir daí, virou moda). É importante saber que as CPIs não precisam de provas. Bastam acusações e que o povo saia às ruas apoiando o julgamento punitivo e político do presidente. Por isso, Fernando Collor renunciou para não ser vítima de um processo de impeachment, pelo qual perderia para sempre seus direitos políticos. E a elite aprendeu que, para derrubar um presidente, é necessária apenas uma CPI. Portanto, o medo de um/a presidente indesejável tem uma solução: a CPI.

A própria carta de 1988 é parlamentarista (em contradição com o regime político, que é presidencialista). Quando da escritura da Constituição de 88, temia-se que Lula fosse eleito presidente. Desta maneira, dentro da referida carta, duas prerrogativas foram colocadas: a primeira foi marcar um plebiscito para 1993, no qual se decidiria se o Brasil seria Monarquia ou República, presidencialista ou parlamentarista. E assim o Lula presidente perderia seu poder para um primeiro-ministro caso o Brasil se tornasse parlamentarista. Nada disso foi preciso porque Lula perdeu a eleição, mas a lição ficou. Segunda, como a referida carta deu direitos aos trabalhadores, pois o povo estava nas ruas, propôs-se uma revisão da carta constitucional para 1995, com o intuito de reformar a legislação trabalhista. No entanto, nada disso ocorreu em 95, pois a agitação nas ruas continuava.

Como ficou dito, é possível extrair lições da História do Brasil. Para que um golpe dê certo, é preciso o apoio dos EUA, preparar lentamente, por meio das mídias, o povo brasileiro e, além disso, entender muito bem dos meandros das leis brasileiras para tornar possível o impossível.

 

Prof. Egydio Neves Neto

Prof. Renata Neres