Escravidão, música e pedido de perdão

08/05/2023

Américo Perin

 

Desde o início da chegada dos negros vindos da África, já os donos de fazendas pensavam uma forma diferente de como tratar os escravos. As fugas constantes dos índios, que tão bem conheciam o território em que nasceram, e as constantes mortes por doença – depressão – alertaram os donos de escravos para que pusessem em prática uma estratégia diferenciada, que lhes protegesse seus interesses econômicos.

Não como produto de bondade, mas sim como estratégia que escondia por trás o interesse econômico de um melhor aproveitamento da mão de obra dos escravos, eram feitas certas concessões a fim de que “colaborassem” melhor com o trabalho exigido pelos seus senhores.

E isso se deu no campo da religião, da música e até no respeito à hierarquia que os negros já traziam entre eles. Não podemos esquecer que, na África, eles já tinham uma estrutura social bem definida, com seus usos, costumes e seus príncipes – muitos deles que também vieram como escravos.

Os portugueses, sabendo disso, facilitavam por exemplo a festa do Rei do Congo, que nada mais era do que uma festividade rica em significados para o negro escravo, mas que propiciava um estreitamento muito interessante para os portugueses, nas relações entre eles e os líderes dos escravos. Essa festa, embora muito modificada, ainda é encontrada nas tradições no nosso interior, como as congadas etc. Segundo alguns historiadores, a congada foi o que poderia se chamar de precursora do nosso carnaval.

Com o passar do tempo, as fazendas foram criando suas bandas de música, com instrumentos e professores europeus. Os músicos eram os negros. Sabe-se que as fazendas disputavam entre si quem possuía a melhor banda e isso era decidido em encontros festivos. Mas ainda não se pode considerar nessa época o nascimento da música popular brasileira, pois o que se tocava nessas bandas eram músicas trazidas e ensinadas por europeus.

Acredita-se que a verdadeira música popular brasileira tenha surgido realmente nas ruas das cidades, tocadas pelos negros alforriados que para lá se mudavam. Ficaram conhecidas como músicas dos barbeiros, pois esses negros traziam consigo os ofícios aprendidos nas fazendas e entre eles o de barbeiro.

Aí, sim, quando depois do trabalho terminado, esses barbeiros reuniam-se nas calçadas e bares para fazerem uma música livre e darem asas à sua criatividade. Sem a influência direta, nem dos portugueses, nem do batuque que tinham trazido consigo para uso nos rituais religiosos praticados nas senzalas, que lhes dava força para o trabalho e lhes mantinha acesa a esperança da fuga para a liberdade da qual eles nunca desistiram. Sem saber, estavam criando a música popular brasileira.

Pesquisando-se a história do povo negro, sabemos que ao contrário do que nos ensinam nas escolas, eles traziam consigo uma cultura rica e uma organização social bem definida, com reis e príncipes. Havia até uma certa etnia vinda do centro da África que era letrada e versada em cálculos matemáticos, devido a seus contatos milenares com os povos árabes. Isso nos leva a imaginar como seria hoje o continente africano, não fossem as colonizações europeias que sugaram e sugam até hoje tudo o que de bom tem naquelas terras. O pensamento do negro africano, antes das invasões europeias, assemelhava-se bastante ao que ocorria na Grécia da antiguidade. E isso nos leva a perguntar como não estaria esse povo hoje, se eles tivessem tido a oportunidade de se desenvolver por si, dentro do seu próprio país, tão rico de recursos naturais?

Talvez a maior violência praticada contra os povos africanos não tenha sido somente a sua captura para trabalho escravo em países distantes, mas sim a que se pratica até hoje com a presença em seu território de povos de outros continentes, que lhes roubam as riquezas e os deixam a mingua.

Bem, mas isso já é assunto para outra oportunidade. Vamos parar por aqui lembrando que a “síncopa” que tão bem caracteriza nossa música foi trazida pelos iorubas, etnia majoritária da Nigéria.

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E lá vinha eu, após um dia de trabalho, voltando de Campinas para Piracicaba. No Ônibus, na fileira ao meu lado, um rapaz, branco, colocou seu pé no braço da cadeira a sua frente. Um negro que ali viajava pediu com delicadeza, porém com um ar bastante firme que o rapaz “por gentileza tirasse seu pé dali”. Sim, o moço obedeceu sem reclamar.

Eu não deixei passar a oportunidade e perguntei ao negro: “o senhor estava dando aula?”. E o diálogo seguiu:

- Estava. Hoje, foi um dia estafante. Mas nós nos conhecemos?

- Claro, professor – respondi. Conversamos certa ocasião e aprendi muita coisa consigo, conversa agradável que deveríamos repetir!

Pois é, o negro era um professor doutor que lecionava na UNICAMP.

E... Naquele tempo não existiam cotas para “minorias” se inscreverem nos vestibulares!

Então, salve o 13 de maio, salve a Família Imperial Brasileira, que tinha ideias republicanas e nunca simpatizou com a escravidão, particularmente a Isabel do Brasil, cognominada "a Redentora”, filha mais velha do imperador D. Pedro de Alcântara, o nosso D. Pedro II...