Eternamente 22
Para a nossa discussão de hoje, vou usar boa parte das ideias do genial Ruy Castro, que dispensa apresentações e que, mais uma vez, mostrou-se um escritor inteligente, mas, principalmente, alguém capaz de escrever de maneira deliciosa. Por isso, recomendamos o livro “Metrópole à Beira-Mar”.
Entre mil histórias importantes e interessantes sobre o Rio de Janeiro do período de 1919 a 1930, evidentemente, ele trata da famosa Semana de 22. Ruy, com sua sagacidade, nos mostra relevantes bastidores do evento já referido e nos convida a um novo olhar sobre a Semana.
Não se trata de desmerecer os modernistas paulistas e muito menos de diminuir a importância do modernismo paulista, e sim de colocar as coisas nos seus devidos lugares, como, por exemplo, o quanto Di Cavalcanti foi importante na criação da missão paulista e ainda mais: Castro mostra o quanto os cafeicultores paulistas, como Paulo Prado, foram importantes para a ocorrência dessa semana de 3 dias. Para além disso, como Oswald de Andrade, um dos articuladores da semana, percebendo que ela poderia ser um fracasso, no sentido de chamar a atenção da população, contratou pessoas para vaiarem os modernistas (coisa muito comum na Europa, mas aqui era uma novidade). E assim, vaiados pela claque, conseguiram o escândalo que Di Cavalcanti tanto queria.
Mas, como sempre acontece, com a passagem da História, esse episódio foi sendo esquecido e uma outra história foi sendo construída sobre o modernismo paulista. Quem gosta de estudar História sabe que essas coisas são muito comuns. Nada muda mais do que o passado, e o interessante não é desmerecer esse ou aquele autor, mas perceber que a verdade histórica é poliédrica.
Assim podemos perceber que a Semana foi e é seminal e ainda continua dando frutos, como o de que o Renascimento Italiano ainda não morreu. Se olharmos os quadros de Tarsila do Amaral, percebemos o que se desejava com o modernismo paulista. O quadro “Antropofagia” mostra cores que a artista associava ao atraso do Brasil, por ela classificado como caipira. Nas palavras da pintora, tais cores eram verde cantante, azul puríssimo e amarelo vivo. Esse era o Brasil a ser antropofagicamente superado. Já no quadro ‘Estrada de Ferro Central do Brasil’, percebe-se claramente o desejo dos modernistas que pensavam o futuro do Brasil. O trem e as ferrovias levariam o progresso tecnológico do primeiro mundo para os confins do Brasil.
É perceptível neste quadro a ausência de seres humanos, o que, talvez, denote que, no Brasil, a modernização seria feita por cima (como, aliás, o foi), pois os cafeicultores financiaram a industrialização no Brasil, não sendo necessária uma revolução burguesa igual à da França, e muito menos uma revolução comunista. Destarte, percebemos no modernismo a História do Brasil pretendida pelas elites. As transformações realizadas pela própria elite de maneira lenta, lucrativa e sem perder poder.
Autor: Egydio Neves Neto