OPINIÃO - O desperdício e a fome
Arnaldo Jardim
O Governo do Estado e a Prefeitura de São Paulo integrarão suas ações de abastecimento para garantir à população uma oferta maior de produtos agropecuários de qualidade. Por meio de nossa Secretaria de Agricultura e Abastecimento, atuaremos junto ao Executivo paulistano também para incentivar a adoção de hábitos alimentares mais saudáveis.
Essa união de esforços é extremamente pertinente quando fazemos uma análise da questão da alimentação. O mundo demandará mais comida, precisamos aumentar a produtividade – sem deixar de lado a preservação ambiental e a segurança dos alimentos – ao mesmo tempo em que devemos também combater o desperdício.
Estudos da Organização das Nações Unidas (ONU) projetam em 60% o aumento necessário na produção agropecuária para atender uma população estimada em 9 bilhões de pessoas até o ano de 2050. Mas há um grave problema no enfrentamento deste desafio: o desperdício.
Enquanto uma em cada nove pessoas no mundo sofre de fome ou má-nutrição, um terço de toda a produção mundial de alimentos é perdido e/ou desperdiçado a cada ano. 50% no transporte, 10% na colheita, 30% nos centros de distribuição e 10% na comercialização e no consumo final. É o resultado de práticas de produção, logística e consumo pouco sustentáveis, como aponta recente estudo da Basf.
Nos lares latino-americanos, o desperdício é de 10% com cereais, 10% frutas e vegetais, 6% carne, 4% leite, 4% peixe e frutos do mar, 2% oleaginosas e leguminosas e 4% raízes e tubérculos.
Por exemplo, a produção de tubérculos e raízes somou 1,9 bilhão de dólares em 2013, enquanto perdas e desperdícios totalizaram 202,9 milhões de dólares – 10,38% da produção total. Somente na cadeia produtiva da batata, o desperdício consome 10%.
Para se ter uma ideia, este número representou em 2013 aproximadamente 381,5 mil toneladas de batata no lixo - montante que seria suficiente para suprir naquele ano toda a demanda por importações dos países do Leste da África, Ásia Central, América do Sul ou, ainda, do Leste Asiático.
No trigo, perdas e desperdícios somam quase 12% do que é produzido, dos quais: 50,8% na produção, 42,4% nas cooperativas (armazenagem), 42,2% no transporte entre a fazenda e a cooperativa e 2,6% no transporte entre a cooperativa e o moinho.
As maiores perdas e desperdícios ocorrem nas cadeias produtivas de frutas e legumes, principalmente pelo fato de essas culturas serem altamente perecíveis. Em média, nas 10 maiores capitais brasileiras, o consumo anual per capita de vegetais é de 35 kg, enquanto o desperdício per capita é de 37 kg.
O tomate é um dos exemplos mais destacados. A estimativa é de que mais de 2,27 milhões de toneladas do fruto foram desperdiçados em 2013 no Brasil: 20% na produção, 20% processamento e embalagem, 12% na distribuição, 10% no pós-colheita e 10% no consumo. É um valor que representa 54% da produção brasileira total para o mesmo ano, número maior que a produção total de tomates de países como a Indonésia, Filipinas, Tailândia e Paraguai no ano de 2013.
Afora toda a questão moral e ética que envolve o desperdício de alimentos, esse material orgânico jogado fora gera impacto ambiental, econômico e social. O descarte gera níveis demasiadamente altos de CO2 – cerca de 3,3 bilhões de toneladas por ano – e agrava o efeito estufa.
Essa parceria que o governador Geraldo Alckmin e o prefeito João Dória oficializaram no último dia 9 tem como objetivo ampliar as opções de abastecimento para a população paulistana com opções como o Programa Horta Educativa, da nossa Secretaria de Agricultura e Abastecimento, que desenvolve hortas onde crianças e adolescentes aprendem a plantar os alimentos que fazem bem à saúde.
Queremos fomentar o conceito de agricultura urbana ou periurbana, incentivando o cultivo de alimentos em espaços menores e dentro de ambientes urbanos. Ampliaremos o projeto estadual Bom Preço do Agricultor na capital paulista, possibilitando um canal direto de comercialização entre produtores e consumidores.
Promoveremos a intersetorialidade em matéria de segurança alimentar e nutricional, ou seja, conectar todas as ações dos governos para o incremento das políticas públicas sobre o tema. Também intensificaremos a qualificação e o preparo dos agricultores familiares, capacitando-os para participarem dos editais de compras públicas de alimentos feitos pela Prefeitura. Nossa parceria inclui ainda a difusão de publicações para que a população tenha condições de melhorar os seus hábitos alimentares a um custo mais acessível.
Esperamos com essas ações cumprir o importante papel de conscientizar nossa população sobre os ganhos – econômicos, sociais, ambientais e para a saúde – trazidos pelo consumo consciente: o ingrediente principal na receita de enfrentamento à fome e ao desperdício.