Reforma Tributária – Parte II - O caso do Sistema Tributário em números
Quando vou falar sobre o sistema tributário brasileiro, costumo sempre contar sobre um episódio que aconteceu comigo visitando um cliente nos Estados Unidos, sediado em Miami. Trata-se de uma multinacional americana com operação em praticamente todos os países do globo e com escritório em mais de 40 países de todos os continentes.
Certa feita, em uma visita corriqueira, eu estava conversando com uma diretora da área fiscal e tributária da empresa e ela me deu um número estarrecedor: a empresa tinha 80 analistas ou advogados tributaristas, sendo que metade deles cuidava do Brasil e metade do mundo inteiro.
Pasmem, metade dos colaboradores da empresa para cuidar de um só país e outra metade para cuidar de mais de 200 países. Para mim, a partir deste dia, passou a ser este o resumo do caótico sistema tributário tupiniquim.
Aqui vão algumas explicações do porquê algo vai muito errado em nosso país:
Quantidade de tributos: O Brasil possui uma grande quantidade de tributos, incluindo impostos federais, estaduais e municipais, taxas e contribuições. Estima-se que existam mais de 90 tributos diferentes no país.
Carga tributária: A carga tributária brasileira é alta em comparação com outros países. Em 2020, a carga tributária bruta atingiu cerca de 33,5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Em que pese os países da OCDE terem uma média de carga tributária em 33,8% do PIB, não é uma boa base de comparação, já que o Brasil não é um país desenvolvido.
Tempo gasto com burocracia tributária: Empresas brasileiras gastam uma quantidade significativa de tempo lidando com a burocracia tributária. Em média, as empresas gastam cerca de 1.958 horas por ano apenas para cumprir suas obrigações tributárias. Em muitos países da OCDE, o processo de arrecadação e conformidade tributária é mais simplificado e eficiente do que no Brasil. Isso pode ser evidenciado por práticas como a declaração pré-preenchida de impostos, sistemas eletrônicos de arrecadação e maior automatização dos processos fiscais.
Tempo de dedicação aos impostos: Um estudo realizado pelo Banco Mundial em 2020 mostrou que, em média, um empresário brasileiro gasta cerca de 1.501 horas por ano apenas para lidar com impostos.
Cumprimento de obrigações tributárias: O Índice de Complexidade Tributária (ICT), elaborado pela Fipe em 2020, classificou o Brasil em 184º lugar em uma lista de 190 países em termos de complexidade tributária. Isso demonstra o grau de dificuldade e complexidade enfrentados pelos contribuintes brasileiros.
Sonegação fiscal: A complexidade do sistema tributário muitas vezes contribui para a sonegação fiscal. Estima-se que a sonegação de impostos no Brasil alcance bilhões de reais anualmente, afetando a arrecadação e prejudicando os investimentos públicos.
Transparência e regras claras: Muitos países da OCDE possuem regras tributárias claras e transparentes, proporcionando uma maior segurança jurídica para os contribuintes. No Brasil, por outro lado, a interpretação e aplicação das leis tributárias podem ser mais subjetivas, levando a uma maior incerteza e disputas fiscais.
Neste sentido, não há dúvidas que o texto da reforma tributária, que passou na Câmara dos Deputados semana passada e hoje está no Senado Federal, é um grande avanço para o país, em que pese muitos reparos a serem feitos e que merecem atenção do Senado. Caso contrário, o bem-vindo IVA ficará acima de 25%, o que seria catastrófico para o setor produtivo.
Marcelo Fortes Giovannetti, graduado e pós-graduado em Direito pela PUC/SP, com especialização em Direito Empresarial do Trabalho, Direito Concorrencial e Regulatório FGV.
contato: marcelo.fortes@mfglaw.com.br.