Uma lição de História
São muitas as ferramentas que um historiador pode usar para interpretar os fatos históricos. Assim temos vários tipos de escolas históricas como, por exemplo, o marxismo, a visão da teoria crítica, a história da mentalidade, a história da vida privada e assim por diante... Por isso, repito, dependendo da ferramenta usada pelos historiadores teremos diferentes interpretações sobre o mesmo fato, talvez isto dificulte para os leigos o entendimento da disciplina chamada História, no entanto, para os amantes das ciências humanas isto é realmente empolgante e eles podem, a partir do conhecimento da ferramenta usada, perceber se a interpretação dada à uma série de fatos faz sentido ou não. Logo é o estudo da história do pensamento que possibilita entender o estudo da História, portanto não basta a leitura de um determinado livro de história para que uma pessoa possa acreditar que ela sabe o que aconteceu sobre um determinado evento histórico, como, por exemplo, a queda de Roma, acontecimento que mereceu até esse momento duzentos e cinco livros diferentes.
Outro exemplo é a conhecida Revolução Francesa de 1789 que mereceu também, até esse momento, 22 autores discutindo e afirmando interpretações diferentes como, por exemplo, os que dizem que não houve Revolução Burguesa na França de 1789.
Tudo isto nos mostra como é difícil e exige muito estudo por parte daqueles que querem realmente aprofundar-se nas discussões e interpretações dos fatos históricos.
É nesse sentido que depois de 40 anos me dedicando à leitura não só de livros de História como também de livros filosóficos, que posso dizer que aprendi algumas lições graças a esses anos de estudo da História do Brasil.
Primeiro, aprendi com Maquiavel que os homens estão sempre fazendo as mesmas coisas, portanto podemos prever muito do que eles vão fazer e ainda com esse autor aprendi que ‘a roda da fortuna’ roda, isto significa que uma hora os fatos são favoráveis a um político e num outro momento são desfavoráveis e que 50% dos fatos são previsíveis e os outros 50% são, evidentemente, imprevisíveis mas, é nesta hora que o político deve mostrar o quanto é um bom político e estar preparado para as adversidades.
Aplicando esses conhecimentos à História do Brasil aprendi que uma boa parte da História do nosso país é muito constante, pois as mudanças internas estão condicionadas a dois eventos: primeiro às transformações tecnológicas e sociais advindas dos países importantes economicamente e, em segundo lugar, à necessidade de trazer essas transformações para dentro do Brasil, portanto todas as novidades dos países importantes vem para o Brasil, mas o segredo é saber se essas transformações encontrarão obstáculos no nosso país, porque parte da elite brasileira é contra a novidade, mas uma parte da elite percebe a necessidade da mudança, mas vai realizá-la de tal maneira que a mudança seja a menos traumática possível, sem grandes transformações impedindo mudanças sociais radicais e principalmente dando lucro para essa elite que é agente da mudança.
Entender essa lição é conhecer boa parte da História do Brasil, que pode ser resumida na frase ‘lenta, gradual e segura’ é a nossa maneira de trazer as tecnologias modernizadoras lá de fora adaptando-as ao jeito brasileiro de viver e, repito, tendo lucro com isso e mantendo a associação com o capital estrangeiro que vai financiar o nosso progresso econômico e social.
Desta maneira a parte da elite retrógrada que fica contra a mudança em alguns anos perde o poder e às vezes até mesmo seus recursos econômicos, pois mão adianta ficar contra a ‘roda da fortuna’ quando ela está rodando. Podemos exemplificar essas afirmações com alguns exemplos: primeiro com a libertação dos escravos, sabemos que a Inglaterra pressionava pelo fim da escravatura no Brasil desde 1808 mas a libertação só veio em 1888, quando era do interesse da elite modernizadora e o país estava preparado para a transformação, porém, a elite retrógrada insistiu na crença que a escravidão não acabaria, portanto quando ela veio fazendeiros escravocratas perderam tudo. Outro exemplo foi a industrialização realizada pelo estado getulista que precisou impor uma ditadura chamada estado novo para conseguir modernizar o país contra aqueles que desejavam manter o Brasil agrícola, não percebendo que os EUA eram a nova potência mundial que exigia transformações econômicas no Brasil e que a existência da URSS exigia, por sua vez, que ocorresse um novo jeito de tratar os trabalhadores (CLT) para impedir uma possível revolução comunista no Brasil. Por fim, a morte da URSS em 1991, a vitória dos EUA sobre o Oriente Médio e a quarta revolução industrial que ainda está em curso (a revolução 4.0) exigem transformações tecnológicas, sociais e políticas que de novo encontram obstáculos por parte daqueles retrógrados que não entendem que mais uma vez a ‘roda da fortuna’ está circulando e que portanto por mais que queiram será impossível pará-la.
Destarte, podemos dizer, baseado na História do Brasil e nas lições que ela nos dá, que as transformações que estão em curso mudarão todas as relações no Brasil.
Autor: Egydio Neves Neto