Américo Perin

11/11/2024

Incorporamos na mesma turma. Segunda de 1965, no tempo em que corruptos e comunistas nos respeitavam até de longe. O Catatau, apelido que ganhou no quartel, era forte, praticava box na categoria meio pesado. Nariz quebrado; boca para um lado e nariz para o outro, e uma bela voz de tenor. Não chegou nem a S1...

Filho único de um advogado bem-sucedido na profissão, mas faltava-lhe juízo. Eu recebi promoção, ocupei a função de sargenteante da PA, mas nossa amizade não se abalou por isso.

O Catatau adorava uma cadeia. Se entrasse na escala de serviço, era necessário deixar um soldado de reserva, pois o danado sempre abandonava o posto para ir namorar. “Era figura obrigatória na hora do pato”: Para quem não sabe, às 13 horas, logo após o descanso do almoço, punha-se a tropa em forma e o capitão “convidava” alguns nomes que eu “gentilmente” lhe passava, para terem uma conversa na sala do comando. Depois da “conversa” com o capitão, o assunto voltava para mim: era um pernoite aqui, um xadrez ali... De acordo com o grau de “orelhada” que o soldado tinha dado.

E mesmo assim éramos amigos próximos. Morávamos no mesmo bairro em São Paulo, o Ipiranga. Vez ou outra, o Cabo Sales juntava-se a nós e íamos passar o fim de semana na fazenda da família do nosso amigo S2. Isso, claro, se o Catatau não estivesse de férias no xadrez da Base Aérea.

Acontece que, certa vez, o Capitão Reis ordenou que eu escalasse um motorista, estafeta e segurança para trabalhar junto ao Coronel. Óbvio que argumentei com o Capitão sobre a conveniência do nome

escolhido: o Catatau!!! E logicamente minha opinião não foi aceita. Lá foi o Catatau para sala do Coronel. Depois, foi-me explicado que, para aquela função, o homem indicado seria alguém com as “especialidades” dele...

Não muito tempo depois, eis que recebo ordem para montar uma patrulha e ir buscá-lo, pois iam-se lá alguns dias que ninguém via o soldado pelo quartel...

Se eu cumprisse a ordem na forma ordenada, ele viria, pois, para trazê-lo, só “na bala”. Bem, quando nos demos conta, eu e o Cabo Sales estávamos no Jeep azul a caminho de Sorocaba. Na fazenda, o caseiro informou que o Catatau tinha passado por lá, claro, acompanhado de uma linda moça, mas em seguida foi para a cidade, pois naquele fim de semana estava tendo uma quermesse. Em Sorocaba, o padre nos informou que tinha havido um enorme quebra-quebra e o “rapaz” só foi dominado após terem chamado reforços... Ah! Era ele!!!

Na delegacia, o delegado nos perguntou se nós teríamos ido buscar o TENENTE Catatau...

Bem fomos levados à cela onde o Tenente nos recebeu, todo machucado e roupa rasgada. Para não piorar tudo, enquadramo-nos frente ao Tenente na forma do regulamento e, com ele à nossa frente, caminhamos até o Jeep. Ah! Claro que, ao passarmos na frente da mesa do delegado, ele mostrou aquele conhecido gesto com os dedos.

Explicando: Numa das ausências do Coronel, o danadinho pegou no armário uma identidade em branco e também um certificado de exame médico com data de validade correta – ainda não existiam computadores, tudo aconteceu com a velha e boa máquina de escrever. Com isso, “surgiu” o Tenente Aviador Catatau!!!

Chegados de volta à BASP, o xadrez já estava com o beliche preparado para o conhecido hóspede.

Há pouco tempo soube que hoje, o Catatau, claro que com seu nome verdadeiro, é um bem-sucedido e próspero advogado.

Catatau, se essa crônica chegar a você, deixo-lhe minha continência pelo atrevimento...

Saudade, meu amigo!!!!